O que pode o corpo? Conheça Sr. Souls, banda goiana anticapacitista

O filósofo holandês Baruch Espinoza levantou uma questão fundamental às potências do ser humano: O que pode o corpo? A humanidade vem respondendo fragmentos desse questionamento, claro que cada corpo com sua particularidade e potência. Já vi mães dando mortais carpados para salvar um bebê em queda (sem nunca ter feito uma aula de ginástica artística), ou até mesmo pessoas que enfrentam um mar revolto para salvar o afogado.

E você fã de rock se perguntando “porque cargas d’água este cara está escrevendo sobre Espinoza na 89 Rádio Rock de Goiânia?”, te explico questionabilíssimo leitor, o jornalista que aqui escreve se deparou fortemente com esse pensamento ao escutar nas palavras de um músico, não tão jovem, mas gigante em sua mensagem que “Os maiores desafios da banda [Sr. Souls] são inúmeros, mas principalmente nas aberturas de oportunidades para uma banda com deficiência se apresentar, pelas limitações, porque a banda tem as limitações físicas. Temos barreiras arquitetônicas, a questão da acessibilidade arquitetônica. A gente enfrenta isso no dia a dia também, então para adaptar essa nossa rotina com o ensaio não é fácil, porque cada um tem sua limitação física”, esse é Silvio Pereira de Sousa de nome artístico – Silvio Souls.

Silvio Pereira (voz e violão), Washington Micena (bateria) e Pedro Fleury (baixo).

Silvio é integrante da banda Sr. Souls, portanto se você está lendo este rabisco até aqui, PARE! Escuta ai! Acontece que Silvio Pereira (voz e violão), Pedro Fleury (baixo) e Washington Micena (bateria) se juntaram com um propósito em comum, a música, a semelhança entre eles, além da luta incansável para acabar com a IGNORÂNCIA DO CAPACITISMO, todos os três possuem algum tipo de deficiência “A banda surgiu da necessidade de se provar para o público e para os produtores de modo geral que músico com deficiência, cantor com deficiência, pode ocupar grandes centros sem as pessoas ficarem olhando para a deficiência desse cantor ou para a deficiência desse músico”, conta o vocalista.

Silvio revelou ainda que a Sr. Souls de alguma forma tenta provar que é possível produzir música de altíssima qualidade, sendo deficiente, mas sem que este seja o principal objetivo: “Esse não é o objetivo. O objetivo nosso é latente, é urgente, é combater o capacitismo cultural. Essa é a nossa militância”. Capacitismo, para você que não sabe do que se trata é uma forma de preconceito contra pessoas com deficiência, o capacitismo é a discriminação ocorrida por meio de determinados tratamentos, formas de comunicação, práticas, barreiras físicas e arquitetônicas que impedem o pleno exercício da cidadania dessas pessoas, se você lê este texto, sentado em um café delicioso, com pássaros cantando, mas estacionou seu veículo em frente uma rampa de acesso ou em uma calçada com piso tátil, vou pedir para o Sr. motorista Raúl Seixas parar o ônibus e te expulsar aos gritos. Brincadeiras a parte, o Sr. Souls é sem dúvida um patrimônio, não só pela proposta potente e gigante da banda, mas pela qualidade sonora.

Silvio Pereira (voz e violão), Washington Micena (bateria) e Pedro Fleury (baixo).

“O capacitismo cultural existe mais do que nós imaginamos. Ele está principalmente nos grandes centros, nos grandes palcos, nas grandes produtoras, nos grandes produtores, até mesmo os pequenos e médios produtores. Essas pessoas não pensam em abrir portas para músicos, cantores com deficiência, e a gente é a única banda do Brasil formada por três músicos com deficiência que têm esse tipo de trabalho no combate ao capacitismo cultural”, Silvio Souls dando a letra.

O negócio é que a única banda do Brasil formada por três músicos com alguma deficiência, pode chocar e impactar muitos desavisados da potência do corpo, o Silvio fez questão de repetir mais de uma vez “a música representa tudo para mim, representa tudo… não me vejo vivendo sem a música. A música me libertou da depressão… da solidão… dos problemas… de inúmeros problemas…”. Todos nós Sr Sílvio, todos nós, quem não gosta de música, bom sujeito não é (talvez não seja exatamente assim).

Pedro Fleury Baixista da Sr. Souls

Outro músico que também respira e inspira sonoridades e melodias é o Pedro Fleury, baixista da Sr. Souls. Segundo ele o grupo tem forte influência da mpb dos anos 60, da música do nordeste, rock, blues e jazz:

“Para mim a música é como a vida… ela tem suas nuances… e a jornada de aprendizado na música é tão infinita quanto na vida”, comenta Pedro.

Pedro comenta que uma característica fundamental para sua carreira musical foi sua rede de apoio, segundo ele até para quem não possui nenhuma deficiência, seguir a carreira musical é desafiador: “Para a pessoa com deficiência a dificuldade é ainda maior, não vejo um grande incentivo pra PCD seguir carreira na música. Acho que tem de amenizar um pouco os desafios se a pessoa tem uma rede de apoio ali com ela, né?“.

Respondendo a pergunta fundante de Espinoza, os integrantes da banda Sr. Souls podem dizer com certeza que estes corpos musicais, artísticos, podem tudo. Como ensinado por Silvio, abaixo ao capacitismo cultural!

Breno Magalhães é jornalista e locutor da 89 Rádio Rock de Goiânia, músico frustrado e cineasta de fita crepe.

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